terça-feira, 9 de setembro de 2025

Julho, 2004

Num local que não deve ser mencionado

—Boa tarde. O professor já corrigiu os nossos trabalhos?
—Olá, boa tarde. Não. Tenho os vossos trabalhos no servidor, mas não consigo aceder. Começo a achar é que devia tê-los copiado para a minha pen.
(Uns minutos depois.)
Não, continuo a não conseguir. Deve ser falha de rede. Devem estar em manutenção. Assim que der, eu corrijo e deixo as notas no site da cadeira, que se calhar também está em baixo.
—Não, o site está online, estive lá ainda agora.
—Se calhar ficou em cache... por aqui está mesmo inacessível.

Mostrei o ecrã do meu computador com a mensagem de erro.
Os alunos viram, olharam um para o outro.

Ok. Obrigado. E saíram.
Eu continuava a não conseguir entrar no servidor.

Abri a minha mochila. Tirei de lá um livro. Bateram-me à porta.
—Entre. — disse. Entrou um primo meu.
—Olha, o que foi aquela m**** da manhã?
—Se estás a falar do exame, não toquei nele, o gajo fez o exame sozinho, nem me mostrou. Chegou atrasado e fotocopiou em cima da hora. Vi ao mesmo tempo que vocês, mas não me pareceu muito mau.
—Ainda por cima!! Não não falo disso, falo do discurso dele no princípio do exame.
—Olhei para ele como um burro a olhar para um palácio.
—Estás a falar de quê?
E ele contou-me uma história que não me fez sentido nenhum, até mais tarde.
Comecei a olhar para a falta de acesso ao servidor com outros olhos.
Fui ao gabinete de um colega.
—Olha, podes fazer-me um favor? Vê se consegues entrar na minha pasta no servidor.
—Não sei se tenho permissão.
—Tens. Estou aqui a dar-ta.— disse, eu a rir.
E de facto... ele tinha acesso à minha pasta, mas eu não. Emprestei-lhe a minha pen.
—Move a minha pasta para aqui se faz favor. Logo à noite envio-te um ficheiro e colocas aí.
—Que se passa?
—Não sei, mas parece que alguém teve um ataque de loucura, apunhalou-me pelas costas, e vai fazer-me lançar as notas do pessoal de ensino de informática fora de prazo.
Voltei ao meu gabinete com os trabalhos na minha pen. E sentei-me a corrigi-los. Foram passando alunos, a contar detalhes... e a história absurda começou a montar-se.
Durante o exame, de manhã, na sala onde eu não estava, no princípio do exame foi feito um discurso a pedir desculpa por qualquer coisa que alegadamente fiz.
Na minha sala, quando eu me preparava para recolher os exames, passaram a dizer para eu ficar mais algum tempo. E fiquei. Eu estava sem relógio, e o meu telemóvel estava sem bateria...
O tempo foi passando.Eu olhava para a porta. Olhava para os alunos.
"Mas porra, é para eu ficar aqui até quando?"
Olhei para o relógio de um dos alunos. Já achava o tempo exagerado. E recolhi os exames.
Deixei-os no correio e fui para o meu gabinete, sem saber de absolutamente nada. O que eu sei foi-me contado pelos alunos.
Cheguei até a ser acusado de dar mais tempo "aos meus alunos". Detalhe: Não estavam alunos meus dentro da minha sala. Estavam na sala onde foi feito o discurso, e foram eles que me contaram.
Alegadamente ofendi uma aluna com uma piada que foi contada dentro do meu gabinete, e que pus numa secção de piadas de uma mas minhas páginas.
Bem... três pessoas pensaram que a piada era elas, nenhuma achou ofensiva. Quem achou ofensiva não me disse nada.
Não ponho a piada aqui, não vá alguma besta ofender-se.
Portanto uma só pessoa (colega) foi juiza, advogada de acusação e só não foi carrasco. O carrasco foi "un hijo de p***" que nem se deu ao trabalho de averiguar factos.
Está em espanhol, é uma pista para alguém que leia este texto possa identificar o fdp sem eu dar nomes.
É assim que "funciona" a justiça naquele lugar, quando funciona.
No fim do dia seguinte, abri uma página no (agora extinto) geocities, deixei as notas, que segundo o regulamento daquela cadeira, tinham de ser colocadas online, e enviei um redireccionador ao outro meu colega, que, como eu pedi, o deixou na minha pasta.
Os meus alunos de ensino de informática não eram burros.
Sabiam o que era um redireccionador até porque eu tinha-os ensinado a fazer um! Fazia parte da cadeira!
Pela única vez na vida, lancei notas fora de prazo.
Desde 2004 que não voltei ali.
 No sítio onde isto aconteceu passaram-se coisas bem mais graves.
A minha versão? Nunca interessou a ninguém.
O leitor está a lê-la pela primeira vez neste blog.
Os anos passaram e de vez em quando era contactado por ex-alunos desse tempo.

Num desses contactos, saíu-me da boca algo que ouvi num episódio de Star Trek Voyager, de 1999.
 
"Fool me once, shame on you. Fool me twice shame on me."

Estamos sempre a aprender. Não quero ser um Júlio César.
Não deixo que me apunhalem, mais do que uma vez mas já tenho uma bela coleção de punhais.

Bom, deixem-me voltar às minhas funções de enfermeiro.
Até à próxima.

PS:
  • 2004 está no século XXI!
  • Com amigos destes, quem precisa de inimigos?
  • UMa vez mais, dali nunca veio sequer um pedido de desculpas, UMa vez mais, a verdade não interessa, só a versão conveniente a certas pessoas(Penso que a conveniencia percebe-se lendo um artigo de opinião do DN-Madeira de Junho ou Julho de 2004, de que não sou eu, nem sei quem é o autor)


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